As
ações da Votorantim na hidrelétrica de Pedra do Cavalo, localizada no Recôncavo
baiano, vem tirado o sono de pescadores e marisqueiras da região.
“Quando as comportas são abertas, é muita água que vem levando
todas as embarcações. Leva tudo pela frente. Os pescadores não são avisados e
acabam sendo pegos de surpresa”, contou a marisqueira e pescadora, Janete
Barbosa, 48 anos, à reportagem de A TARDE.
Foi por
ações como a relatada por dona Janete que uma ação civil pública foi ajuizada
pela Defensoria Pública da União (DPU) na Bahia, em parceria com a Defensoria
Pública do Estado da Bahia (DPE/BA), nesta terça-feira , 1, pedindo a
suspensão imediata das atividades de exploração e produção de energia elétrica
da Usina Hidrelétrica de Pedra do Cavalo.
O defensor
regional de Direitos Humanos, Vladimir Correia, e o defensor público estadual
Maurício Moitinho pediram na Justiça que os réus fossem condenados por danos
morais, por causa dos prejuízos causados ao meio ambiente, à economia da
região e às comunidades residentes na Reserva Extrativista da Bacia do Iguape.
As instituições pedem ainda que os testes de calhas não sejam feitos.
O pedido de
punição tem como alvos o Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos
(Inema), a Companhia de Engenharia Hídrica e de Saneamento da Bahia (Cerb), o
Grupo Votorantim Energia e a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel).
De acordo
com Janete, “a hidrelétrica funciona há 10 anos sem a licença e o Instituto do
Meio Ambiente e Recursos Hídricos, Inema, é conivente”. A marisqueira relata
que sempre tiveram fartura, no que diz respeito às espécies de peixes, mariscos
e ostras. Mas a diminuição já causa prejuízos para quem vive da atividade na
região e ela põe a culpa na Usina Hidrelétrica de Pedra do Cavalo.
“Não temos
outras atividades e não queremos viver de auxílio emergencial. Queremos viver
do trabalho que sempre desempenhamos. São 20 mil pessoas prejudicadas”, disse.
É o que
conta também o ativista quilombola Ananias Viana, morador da comunidade de
Kaonge. Para ele, a situação poderia ainda ser pior e o teste de calha,
previsto para ser realizado no início do mês, não fosse adiado devido a outra
ação da Defensoria Pública.
“Seria
um teste que causaria impactos desastrosos para a nossa baía. Muitas espécies
fogem e não voltam. Peixes, moluscos e outras espécies vêm desovar nos
manguezais. Com o imenso volume de água, os peixes não sobrevivem, ostras
morrem e o povo fica sem o sustento”, ressalta.
Agora, o
pedido das defensorias visa suspender as atividades de energia elétrica da
usina até que se comprove o cumprimento das condicionantes elencadas pelo
Instituto Chico Mendes (ICMBio), que são determinantes para a concessão da
licença ambiental e deveriam garantir a preservação ambiental e os meios
de subsistência das comunidades ribeirinhas.
Em julho
deste ano, associações de comunidades pesqueiras, marisqueiras, ribeirinhas e
quilombolas denunciaram que o Inema havia determinado que a Votorantim
realizasse um teste de calha do Rio Paraguaçu.
Moradores
das comunidades atribuem os impactos e prejuízos ao tipo de operação atual da
hidrelétrica, já que as duas turbinas somadas, funcionando na menor potência,
enviam 80 metros cúbicos de água por segundo no período de até 3 horas por dia.
“As ações
prejudiciais atualmente se dão pela existência da hidrelétrica após a
instalação, no ano de 2005, das duas gigantescas turbinas de geração de
energia. Elas que mandam a enorme quantidade de água que prejudica e ajuda a
extinguir diversas espécies marinhas da baía. Tínhamos famílias, no passado,
com renda percapita de até R$ 300 reais. Hoje essa renda caiu para R$ 20”,
pontuou Ananias Viana.
A DPU e DPE
chegaram a recomendar o adiamento do chamado “teste de calha” até serem
analisados os impactos ambientais e sociais que poderiam ser causados às
comunidades.
Documentos,
autos de infração e relatórios de fiscalização do Instituto Chico Mendes de
Conservação da Biodiversidade (ICMBio – Ministério do Meio Ambiente), datados
de 2014 a 2016, que comprovam danos ambientais causados pela atividade na Usina
Hidroelétrica de Pedra do Cavalo foram analisados pelos defensores públicos.
Os técnicos
do ICMBio disseram que a vazão de água na usina - em diversos horários, com
volumes de água variados – provocaria alterações repentinas, o que diminuiria a
salinidade da água.
Este tipo de
operação não acompanharia o regime das marés, sendo assim, os organismos
aquáticos não teriam tempo de adaptação. Outros documentos mostram que a
operação da hidrelétrica precisa estar condicionada a diversas ações, como
planejamento de novo hidrograma para vazão ecológica, monitoramento dos
impactos ambientais, adequação da planta e motorização da usina, bem como o diálogo
entre a usina e comunidades tradicionais.
Além dos
impactos para as comunidades ribeirinhas, cidades como Cachoeira, com 35 mil
habitantes, São Félix, com 18 mil, e Maragojipe, com 46 mil, além dos povoados
de Nagé, Coqueiros, Santiago do Iguape e São Francisco do Paraguaçu podem
sofrer sérias consequências com um eventual rompimento da barragem.
De acordo
com o professor do departamento de Ciências Biológicas da Universidade Estadual
de Feira de Santana, UEFS, Francisco José Bezerra
Souto, o que aconteceu no último fim de semana foi um problema na turbina da
hidrelétrica. A água não pôde mais passar por essa turbina.
Para
manterem o protocolo da quantidade determinada de água, que deveria ser
colocada pra fora, como não podia colocar pela turbina, eles mandaram pelas
comportas, na parte de cima, porém, não teve mais água, além do normal
previsto. “As pessoas se assustaram quando viram a água descendo pela comporta,
já que havia muito tempo que não se soltava água pela comporta de cima”,
explicou.
Votorantim
Em nota, a
Votorantim Energia, por meio do seu Plano de Segurança de Barragens, mantém um
rígido procedimento de inspeções periódicas em todas as 19 usinas que
administra.
Assim,
de acordo com cronograma estabelecido, a última inspeção regular na UHE Pedra
do Cavalo foi realizada no dia 30/06/2020, por uma equipe multidisciplinar de
engenharia e auditora externa independente. Essa é uma inspeção completa e
detalhada onde são avaliadas todas as estruturas e equipamentos.
A inspeção
realizada no mês de junho atestou as boas condições da Usina Hidrelétrica de
Pedra do Cavalo e de acordo com o diagnóstico de segurança das estruturas e
regulação da ANEEL foi classificada como “Normal”.
A TARDE
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