Apaixonar-se é a parte fácil. Viver um grande amor é complicado. Complicado porque nos apaixonamos pela expectativa que fazemos do parceiro e da relação em si e não somente pela pessoa.
E é complicado porque acreditamos existir uma receita certa para se viver esse grande amor. Cresci recitando o poema famoso de Vinícius de Morais até perceber o quanto ele é, à primeira vista, bonito, mas na prática mesmo revela uma postura um tanto quanto machista. Mas quando a gente revê a postura um tanto arcaica de "fazer do corpo uma morada onde clausure-se a mulher amada e postar-se de fora com uma espada" à impressão não é mais de romantismo.
Outro ponto que acho bem complicado é quando o poetinha diz – que defende a necessidade de se ter créditos no florista – que é "muito importante viver sempre junto e até ser, se possível, um só defunto — pra não morrer de dor". Fica evidente que não é amor. É posse, é egoísmo, é tratar como um troféu, uma relíquia que precisa ser guardada, protegida e mimada, pois "qualquer 'baixo' seu a amada sente e esfria um pouco o amor".
A amada, que tem que ser encontrada na "selva obscura e desvairada" é sempre passiva. E, cá entre nós, nenhum relacionamento resiste à passividade.
Para viver um grande amor – penso eu - é preciso, mesmo, abandonar a ideia do amor romântico. Da necessidade do sofrimento, do tratamento da amada (ou amado) como um objeto a ser conquistado. E que como recompensa oferecerá amor eterno.
Isso tudo é muito ultrapassado. E nunca funcionou muito, na verdade. As pessoas se acostumavam ou desistiam de uma vida mais prazerosa e ponto.
Um amor para ser vivido intensamente é aquele cheio de dualismos. É quando o casal (ou as pessoas envolvidas) tem intimidade para confidenciar segredos – sejam quais forem, e também entende que o outro não precisa saber tudo. Que confiança é saber que pode contar com a compreensão do outro quando precisar.
Aprendi também que para viver um grande amor é preciso amar a companhia do outro, mas também saber que pode curtir os amigos, se dedicar ao trabalho e aos hobbies porque amar a si mesmo também alimenta o relacionamento a dois.
Que ciúme existe e sempre existirá, mas que quando a gente entende que isso só existe pela nossa carência e não pela atitude do outro, a gente começa a aprender a domá-lo até torná-lo insignificante. Porque o que importa é como os que se amam se reconhecem e se respeitam na cumplicidade mútua e na individualidade de cada um.
Fora isso, cada um é livre para viver a sua própria vida, mesmo estando juntos.
Viver um grande amor também exige olhar o outro como ele me vê. E que o outro me veja como eu o vejo. Porque há uma diferença - que não é nada sutil – entre ser livre e ser egoísta. Ser livre é saber que sou adulto, dono do meu nariz e posso fazer, portanto, o que quiser com minhas vontades e desejos. Não ser egoísta é entender que tenho um compromisso com outra pessoa e que minha liberdade termina quando prejudica a liberdade dela. Ou quando isso irá ferir seus sentimentos.
Que se viver um grande amor é saber que pode ir se achar que deve, mas que o que você mais quer mesmo é ficar. Que como as relações hoje em dia são "líquidas", como ponderou Zygmunt Bauman, é preciso tornar cada relação uma conquista diária de fazer valer a pena a tentativa de solidificá-la.
Para viver um grande amor é preciso não encontrar a bem-amada, mas ser encontrado por ela e mostrar o quanto é certa a escolha que ela fez.
Acho que demorei, mas estou aprendendo.
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