quarta-feira, 25 de julho de 2018

Destaque em "Segundo Sol", atriz diz que sofreu preconceito por ser negra e nordestina

Estreante na televisão pela novela da Globo, “Segundo Sol”, a atriz baiana Cláudia di Moura não abre mão da sua paixão pelo teatro. Nascida em Salvador, entre palcos de espetáculos e telas de cinema, já soma cerca de 33 anos de carreira, quatro indicações e uma vitória no Prêmio Braskem de Teatro. No folhetim, ela é a cozinheira Zefa, uma mulher calma e conformada, que esconde um grande segredo do seu filho. Mas na vida real, Cláudia passa bem longe disso ao defender a arte e a representatividade do negro na dramaturgia.

Em entrevista ao Portal A TARDE, Cláudia falou sobre teatro, premiações, preconceito e planos futuros, além de comentar a polêmica sobre racismo envolvendo a trama global das 9, que chegou a receber uma notificação do Ministério do Trabalho a respeito da falta de diversidade na história que é ambientada em Salvador. A atriz também falou sobre as amizades que fez nessa trajetória e as dificuldades que encontrou na profissão por ser mulher, negra e nordestina: “Tive a sorte de ter conseguido ao longo da minha carreira no teatro, uma diversidade muito grande de papéis. Mas eu sei que não é assim com todo mundo”.
Cláudia, além de ser atriz, você é estilista. Como surgiu essa vocação? Atualmente, ainda trabalha com a confecção de roupas?

Ser mãe de meninas às vezes te faz brincar de boneca depois de adulta. E diante das dificuldades que a vida artística impõe, eu transformei essa brincadeira em coisa séria e conquistei a confiança de grandes nomes da música baiana para compor seus visuais. É algo que eu tenho muito prazer em fazer até hoje.

Você foi indicada e premiada tanto no teatro, como no cinema. Qual a sensação de ser tão consagrada?

O reconhecimento é importante, é algo que o artista deseja, uma das recompensas por esse trabalho tão intenso que é viver outras vidas no palco, nas telas. Outras vidas que não são minhas, mas que têm bastante de mim.

Você passou um longo tempo atuando nos palcos. Como e por quê resolveu migrar para a TV?

Passei não, passo. Estar na TV não me tira dos palcos, muito pelo contrário. É um piso sagrado, onde eu preciso estar pra me conectar com a energia da terra, as emoções fundamentais da humanidade. De modo algum fiz uma migração para a TV. Sou uma mulher do teatro, e levo esta formação para a televisão também.

Houve alguma dificuldade nessa transição?

Nenhuma. Fui muito bem-recebida por toda a equipe, principalmente pelo Dennis Carvalho e pela Maria de Médicis. O elenco é uma família, sintonizada na mesma energia. De resto, é só arregaçar as mangas, estudar o texto e dar o melhor de si.

E sendo uma estreante em novelas, como foi a recepção por parte do elenco?

Como eu disse, somos uma família. Desde o início fui meio que adotada como mãe pelos mais novos, e conquistei o respeito e a admiração daqueles a quem eu sempre respeitei e admirei. Isso é reconfortante, é uma realização.

Diante desse acolhimento, acabou se tornando amiga de alguns colegas de cena?

A Deborah (Secco) é uma irmã pra mim, foi quem primeiro me acolheu nessa jornada. A minha relação com a Cássia Kis é uma história de outras vidas. Nesta vida, nós nos conhecemos ao fazer Segundo Sol. E tem o Fabrício (Boliveira), que é meu filho em cena, e que fora dela, é meu amor.

Como atriz, já sofreu algum tipo de preconceito por ser mulher, baiana e negra?

O preconceito veio primeiro por ser atriz, porque nesse sistema em que a gente vive, muitos pensam que artista não trabalha, que o ofício artístico é um hobby, um passatempo, uma terapia ocupacional. Poucos veem como uma carreira séria. E, sendo negra e nordestina, isso é ainda pior. Eu tive a sorte de ter conseguido ao longo da minha carreira no teatro, uma diversidade muito grande de papéis. Mas eu sei que não é assim com todo mundo.

Você tem acompanhado as polêmicas envolvendo a novela sobre as questões de representatividade da população de Salvador? O que acha deste clamor por mais atores negros na trama?

O que eu acho desse clamor por representatividade? Acho é pouco. Não queremos só ser representados em números, mas principalmente, com respeito. Queremos ser tratados com dignidade pela mídia, pela crítica, pelos autores e diretores. Não vamos deixar de reivindicar visibilidade, voz e papéis sempre mais complexos, que retratam nossa humanidade. Além de atores, somos atores sociais.

Pretende voltar para a Bahia após a novela? Quais são os seus projetos para quando o folhetim acabar?

Eu tenho minha família na Bahia, pessoas que eu amo e que me fazem falta. Claro que quero estar perto deles, e o fim da novela vai facilitar esse processo. Porém, quando a novela acabar, eu vou estar só começando. Tenho outros projetos, a vida segue seu curso.

Dentre esses projetos, já está em andamento o plano de encenar novamente com a atriz Cássia Kiss?

No momento ainda não posso entrar em detalhes, mas afirmo que é o sonho de duas mulheres apaixonadas pelo palco e que se esbarraram não à toa nessa vida. Somos um encontro de almas inquietas.

Muitos atores de teatro almejam estar na televisão. De qual dos dois segmentos você gosta mais?

Amo todos. Mas, o teatro está dentro de mim, e eu o levo pra onde eu for.


AT

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